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Anabela Mota Ribeiro

Nikias Skapinakis

14.03.22

"Nikias, o observador de mãos frias", escreveu sobre ele José Gomes Ferreira. O "Provocador Tranquilo", chamaram-lhe em Serralves. O que habita/encena/cria o "Teatro dos Outros", para ir ao título do documentário de Jorge Silva Melo que lhe é dedicado. O que treina a mão na observação do assunto. Qualquer assunto. A vida cá fora. O impacto cá dentro. A contracena. "O pintor do silêncio e da cor" – título de um jornal antigo que lhe assenta bem.

O que fica entretanto? Fica, por exemplo, uma "Cortina Mirabolante". Uma peça dos últimos anos que é pintada à medida que é desenrolada. Pintada à medida que é vivida.

Não muito diferente do que sempre foi. Viver e pintar. E aí entra o observador. De mãos precisas. O do traço frio, rigoroso. Por vezes melancólico, tantas vezes melancólico. O que vive e se reinventa no espaço da pintura. "O pintor vive no rectângulo da sua tela", sabe Nikias.

Há um lirismo em alguns dos seus retratos, sobretudo femininos, dos longínquos anos 50 e 60. E um registo diferente quando pintava paisagens, no mesmo período. Abordagem expressionista. Porque é que é assim? Porque é que, nessa vez, como noutras, ele está em cenários diferentes, recorre a traduções diferentes para aquilo que quer dizer?
Nikias. Quase não é preciso dizer Skapinakis. Nikias basta para o identificar. O pintor português de ascendência grega.

Fala sem sotaque. É lisboeta. (Lisboa também está a tempo inteiro nas suas telas.) Minucioso, perfeccionista. A chegar aos 79. "Vamos manter isto no plano da pintura, sim?". Entrevista realizada por escrito, por razões que à frente se explicam.

Como pretexto, se preciso fosse, para olhar para uma vida: o filme de Jorge Silva Melo, a ser lançado em DVD, e uma exposição e um álbum com a sua obra gráfica ("Desenho a preto e branco e a cores, 1958-2009", no Centro Cultural de Cascais, até 14 de Fevereiro). Mais do que tudo: as coisas que nos interpelam e que estão na sua pintura. De onde vêm estas coisas?

 

 

Não há muitos anos, pintou uma série de quartos imaginários. Quartos ficcionados – disse – de pessoas que gostaria de ter conhecido. Comecemos pelo seu quarto ficcionado. Que elementos teria? O de Frida Kahlo, por exemplo, tem a cama com o espelho, o retrato de Rivera. O de Klee é geométrico e claustrofóbico...

Comecemos pelo Quarto de Frida: as colunas da cama, que suportam o espelho, são pontiagudas e referem-se ao facto de ela ter sido trespassada. O Quarto de Klee é geométrico mas um sol do final do dia aparece, ainda visível na janela. O meu quarto ficcionado será, se calhar, todos aqueles que pintei. [O ensaísta] Michel Butor escreveu a propósito: "Pintar o seu próprio quarto, que coisa mais rara ou mais preciosa. Mas pintar o de um outro artista ou de um poeta, deitar-se nos seus lençóis, mergulhar no tingimento dos seus sonhos, que transmigração!". 

 

Como era o quarto da sua infância? Que objectos, que cenografia ali constavam e que importam? – nem que seja por persistirem na memória. Que sonhos acolhiam? Estou a perguntar pelo menino que era.

Era um menino feliz. Se for à procura desse tempo perdido o que ressalta são os álbuns do Prado, do Louvre e de outros museus que o meu pai me mostrava e eu procuro copiar.

 

Os quartos de Kavafis e El Greco são particularmente importantes? Por terem a ressonância da sua ascendência grega.

Recorro, outra vez, a um escritor: Vasco Graça Moura escreveu no catálogo da Fundação Vieira e Arpad que "o Greco e Kavafis têm o seu lugar numa genealogia que não é apenas cultural. Uma origem que Nikias partilha com eles e aqui acentua discretamente, nos vários cenários do seu teatro de sombras". Penso que a origem grega (paterna) me fez amar a Grécia desde sempre. Kavafis chega-me primeiro pelo "Quarteto de Alexandria" de Durrell, depois por Yourcenar. Greco vem da infância e, mais tarde, admiro profundamente o último Apostolado de Toledo – os quadros ditos incompletos, que não podiam ser acabados porque já o estavam, e se encontram na origem da modernidade: Goya, Cezanne, Picasso.   

 

Para ficarmos ainda na infância: a série dos circos atira-nos para esse tempo em que éramos, justamente, levados ao circo. Mas nos que pintou há quase sempre uma melancolia e uma rarefacção de pessoas. Porquê?

Não sei exactamente porquê. Os meus circos são o prolongamento das paisagens de Lisboa e referem-se a locais precisos, Campolide, Luz, Algés, Areeiro. Este último é o primeiro porque data de 1955, ainda a zona era campo. Em 1964 apareceu o circo da Quarteira que resultou de uma insólita visão de uma barraca no meio de uma praça de terra batida, rodeada de casario de pescadores. A mesma Quarteira que vi ao longe, 30 anos depois, pontuada de arranha-céus. Terá sido essa minha melancólica visão uma premonição urbanística?

 

Fale-me do momento em que percebeu que esta era a sua maneira de se exprimir. E porquê esta linguagem. Ainda que recorra a uma multiplicidade de linguagens: óleo, desenho, litografia... A verdade é que interveio muito, escrevendo, e não é escritor. A verdade é que alguns dos quartos são de escritores e poetas – que admira – e não é escritor.

É verdade que recorro a uma certa variedade de linguagens. Elas respeitam sobretudo à expressão e não às modalidades técnicas. Como a minha obra acabou por se tornar extensa, tenho uma imperiosa necessidade de mudar, não direi de vida, mas de estilo, se este termo ainda significa alguma coisa. Evito cansar-me de mim mesmo praticando maneiras opostas, partindo de uma fase para o seu contraditório e, às vezes, praticando-as ao mesmo tempo. Enfim, se Pessoa tinha tantos heterónimos... Mas, de facto, não sou escritor, nunca o fui, embora nos anos 50 e 60 tenha feito parte das redacções da "Revista de Arquitectura" e da "Seara Nova". A pintura e o estudo da sua história constituem, ainda, o meu ponto de partida. Não tenho outro.

 

Porque é que são estas as coisas que aparecem na sua pintura? As paisagens. Os retratos. A natureza-morta. As mulheres. O diálogo com Pompeia. O abstracto. A melancolia. A alta e a baixa cultura. Os mitos. As personagens presentes e ausentes. São um acesso enviesado ao seu mundo? 

Os retratos, as naturezas mortas, as paisagens, são géneros figurativos que pratiquei mais ou menos regularmente. A parafiguração, abstractizante, que apareceu nos últimos anos de 60, contrariou essa tendência figurativa. Contudo, nunca fui um pintor abstracto, na medida em que os meus quadros, mesmo os mais depurados, permaneceram sempre com uma ligação à realidade. A abstracção na minha pintura deve entender-se como uma disciplina estruturante, aprendida com os mestres da não figuração modernista. Essa disciplina tornou-se evidente na parafiguração que referi e abrangeu diversos períodos, desde os objectos recortados simuladamente nos fundos brancos, às "Paisagens dos Vale dos Reis" e à série "TAG", relativamente recente. Esta série, relacionada com os graffiti, tal como a série mitológica das "Metamorfoses de Zeus", que ilustra as aventuras eróticas do Pai dos Deuses, associaram a cultura erudita com os aspectos emergentes e diversificados da chamada baixa cultura.

Mas é possível que um sentido melancólico envolva todo o meu trabalho, mesmo aquele que refere, agressiva ou ironicamente, as imagens publicitárias ou os murais populares, que exprimem as pulsões do presente.

Interessa-me fundamentalmente o presente, mas analiso a sua diversidade cultural procurando destacar-me e compreender o passado. O passado é omnipresente na minha pintura e também respeita à literatura e até à música. Procuro, talvez enviesadamente, um sentido, um fio de Ariadne que evite perder-me no labirinto dos acontecimentos.  

 

Se estas coisas são a sua cabeça – "Bovary c'est moi" - alguns quadros presumem-se mais autobiográficos do que outros. Porque é que "Mulher com flores à cabeça", de 1955, é um auto-retrato?

"Mulher com Flores à Cabeça" não é propriamente um auto-retrato, género que, aliás, nunca pratiquei. Nesse tempo, em 1955, vi por acaso uma florista que me impressionou e pintei-a, de cor, no atelier. O meu amigo Sena da Silva, quando viu o quadro, disse-me que se parecia comigo e eu concordei. Algo de mim, passou para a mulher, um pouco à maneira de Virginia Woolf, que eu não tinha lido. O quadro representa uma figura campesina, na cidade que aparecia no fundo; realmente não trazia flores, trazia esperança, que era um sentimento que me habitava nesses anos.

 

Outro auto-retrato, assumido, é "O Minotauro expectante", de 1991.

O quadro do Minotauro, que pertence ao período monocromático, encerrou a Retrospectiva de Retratos no Museu do Chiado. Mas aí a esperança tinha desaparecido e dado lugar a um olhar distante, expectante. Os dois quadros estão separados por cerca de quarenta anos e são muito diferentes entre si, relativamente às aparências e ao sentido pictórico. Mas, em ambos os casos, creio que são reveladores de uma minha maneira de olhar o mundo. Por aí, até podem considerar-se auto-retratos.

 

Os críticos dividem a sua obra em vários períodos. O primeiro momento vai dos anos 1950 a 1965. Masculino/Feminino e Rústico/Citadino são dois binómios tratados. Mas também Lisboa e os circos. São as traves essenciais desse período?

É uma análise perfeitamente possível. As paisagens abrangem os campos e as cidades, os retratos, os homens e as mulheres. Lisboa é um tema privilegiado e aparecem óleos, guaches, litografias que assinalam figuras populares, uma espécie de contraponto dos retratos dos intelectuais. A minha ligação é à pintura moderna, aos mestres franceses, italianos, russos e portugueses como Eduardo Viana, Amadeo, Eloy – eles são as traves mestras das minhas origens figurativas, modernistas.

 

Em 1958 pinta um retrato de Almada Negreiros. Fale-me da convivência com os intelectuais do seu tempo. De como eram as mesas de café. Do que se aprendia/discutia nelas.

Se me lembro bem, como diria [Vitorino] Nemésio, que conheci em casa de Natália Correia, os cafés eram tertúlias da época, nas quais se discutia tudo e, que eu saiba, não se aprendia nada. Almada, que também aparecia com Sarah Afonso em casa de Natália, foi sobretudo para mim uma referência intelectual. Quando pintei o seu retrato (que está no Museu de Luanda) disse-me que o tinha envelhecido. Mas estava muito parecido; o espírito dele é que atravessava o tempo.

Natália recebia regularmente como se sabe, escritores, poetas, pintores, actores, filósofos. Era gente que prezava a independência de espírito e que encontrava ali acolhimento inteligente - raro na época salazarista. Aliás, pintei dela dois retratos, um individual em 1959, corresponde aos últimos anos da sua excepcional beleza, e outro participando num "Trouble Trio", como referiu "The Times", e que está na Gulbenkian. Natália era uma força da natureza operando singularmente nas circunstâncias entediantes que nos rodeavam.

Encontrava-me também, nos cafés do Chiado e da Baixa, regularmente, com José Gomes Ferreira, Carlos de Oliveira e Augusto Abelaira. Eram meus amigos e pintei-os a todos. Lembro-me que Gomes Ferreira me dedicou um poema onde dizia: "A morte é o outro lado das flores".

 

Nos anos 50, instalou-se no Atelier Vila Martel, que partilhou com Bartolomeu Cid dos Santos e Sá Nogueira. Um e outro partiram para o estrangeiro. Porque é que ficou em Lisboa?

Creio que eles fizeram bem em partir e eu terei feito bem em ficar. A minha actividade política, legal e subversiva, na época, emprestava-me uma motivação que influenciou a minha capacidade de resistência ao ambiente que defrontava. De resto, não creio que de outra maneira pudesse ter pintado os retratos colectivos dos "Caminhos da Liberdade" e da "Melancolia em Portugal".

 

Descobrir a modernidade, num país que vivia sob uma ditadura: como foi?

As viagens permitiram-me conhecer um grande número de países que me interessavam do meu ponto de vista de pintor. Pude estudar o passado e acompanhar as experiências contemporâneas. Nesse tempo, como se sabe, a informação não chegava, como agora, quase instantaneamente. A solução para acompanhar o que se verificava de significativo, não só no que respeitava à pintura mas à literatura, à música e, sobretudo, ao cinema, era mudar de País, como foi o caso dos artistas auto-exilados, nos anos 60. Ou ficar e tentar retemperar o espírito, viajando sempre que possível. Foi o que fiz.

 

"Um pintor luta quando pinta", escreveu num manifesto em 1958. Esteve na prisão, no Aljube. Como é que o biográfico e o pessoal se inscrevem na sua pintura? Neste caso concreto.  

A minha prisão, em 1962, não teve qualquer consequência no meu processo artístico. Todavia, em 2000, pintei dois quadros ("Paisagem Entrevista" e "As Grades"), acentuadamente monocromáticos, onde reconheci, a posteriori, o ambiente opressivo do Aljube.

 

Como nos circos, é notória a ausência de pessoas nas paisagens deste período. São muitas vezes desamparadas e silenciosas. Ainda mais contrastante se pensarmos no que fez nos anos 60, marcadamente figurativo.

"O Teatro dos Outros", filme de Jorge Silva Melo sobre o meu trabalho, documenta com fotografias, quadros, filmes, de diversos autores meus contemporâneos, esse tempo do negrume português. A sequência fílmica que mostra Lisboa, a preto e branco, nas fotografias de Sena da Silva, Carlos Calvet, Gérard Castello Lopes, Victor Palla, culminando nas cenas de Fernando Lopes, que evocam as noites quentes do Hot Clube ["Belarmino"], remete-nos para um tempo do qual já não há referências.

As pessoas subiam e desciam o Chiado, vestidas de escuro, a cidade era triste, os entretenimentos parcos e vigiados. É uma apagada tristeza o que se conta nessa reportagem breve, por assim dizer, sociológica. E creio que dá uma nova luz às minhas desoladas paisagens e aos meus entediados, ensimesmados, modelos.

 

Em alguns trabalhos, o desenho fica à mostra. Como se fossem costuras. Ou o interior. Porquê essa opção?

Não opto no sentido de determinar previamente que o desenho fique à mostra. O que acontece, mais complicado e difícil de explicar, é que certas coisas aparecem, e dão origem a outras que vão definindo um processo do qual posso, ou não, apoderar-me.

 

O passo seguinte na sua obra, entre finais dos anos 60 e finais dos anos 70, é dominado pelo recorte. Recorte de figuras de um fundo de uma só cor. Aparecem então mulheres, muitas vezes nuas. São muito diferentes das mulheres que apareciam nos anos 50.

A partir de 1965 termina o período lírico-expressionista do meu trabalho. O recorte que se lhe segue é abstractizante em si mesmo e convergem nele simultaneamente leituras do passado e imagens avulsas da publicidade. Esse recortar pode ser simulado na pintura, figurativa ou parafigurativa, ou pode ser efectuado à tesoura, nos guaches que realizo nessa altura.

 

Nessas séries, faz-se a revisitação do espaço de Pompeia e de mitos da antiguidade. "As três graças", por exemplo, decalca o movimento das "Graças" de Pompeia. Explique essa aproximação.

As "Variações sobre o Nu", dos anos 60, são uma obra da transição que antecede a intenção do recorte. Referiam-se às Três Graças mitológicas de um quadro barroco, mas a sua execução está intimamente ligada aos frescos que tinha visto na "Vila dos Mistérios", em Pompeia. A memória dos frescos vem assim juntar-se às imagens publicitárias e da impressão cartazista, na identificação das séries que se desenvolveram entre o final dos anos 60 e o princípio dos anos 80. O quadro de 1967 das "Três graças": são retratos reais de três mulheres que se recortam num fundo branco. Natália Correia, dirá num poema: "Em campo de linho sendo verdadeiras de inventadas." Será uma explicação?

 

Depois de um sentido do real muito marcado, surge uma longa fase abstracta. Que coisas diferentes estão nesses trabalhos?

Não se trata propriamente de pintura abstracta mas de uma tendência parafigurativa anterior. Chamei à série "Paisagens do Vale dos Reis", aludindo às pinturas dos túmulos egípcios que me tinham impressionado. Na generalidade, são paisagens da "crosta terrestre" e parecem corresponder ao ponto de vista distorcido que se verifica quando um avião se inclina para uma aproximação à pista.

 

Outra diferença substancial é a passagem de uma fase em que a pintura parecia dominada pela cor para uma fase monocromática. Revela um ensimesmamento? Por acaso, o segundo auto-retrato assumido é deste período...

Esse monocromatismo, isto é, uma cor avermelhada, cor de barro, onde o desenho se inscreve a negro delineando figuras e objectos, representou para mim a necessidade de uma contenção cromática depois do cromatismo intenso do Vale dos Reis. O "Minotauro Expectante", que já referi, beneficia dessa contenção que me parece propícia à sua postura distanciada.

 

Em 2001 fez uma série de mulheres que poderiam parecer próximas das mulheres dos anos 70. Mas são manequins, que descobriu numa casa algarvia. São personagens e não são pessoas? É ainda um modo de falar da ausência? Formam um teatro? Que dizem elas na história em que interagem?

Esses manequins constituíam uma espécie de teatro surreal, espalhados pela mansão que "habitavam". Retratei-os individual e colectivamente assinalando as afinidades dos seus trajes e as suas atitudes ausentes. Talvez a sua ausência de alma pressinta a clonagem.

 

Disse que não é um repentista, e impôs a condição de a entrevista ser escrita. Porquê esta reserva, esta distância, este silêncio? O que seria diferente se fosse sem rede, ou seja, sem tempo para pensar e digerir as perguntas?

Fui algumas vezes entrevistado para a rádio e a televisão - naturalmente sem rede. Uma entrevista para ser lida, que pretende resumir 60 anos da minha preciosa existência, obriga-me, porém, a consultar diversos elementos e a ponderar a economia das respostas. Realmente, embora converse e discuta com facilidade, não sou repentista. Seria um péssimo advogado de barra e um político inábil, porque a resposta correcta pode não me ocorrer - o que acontece a muita gente boa.

Por exemplo, fiz recentemente uma intervenção na Universidade Nova, no âmbito da História de Arte Contemporânea, e a seguir alguém perguntou se a arte devia escandalizar. Já não recordo o que respondi, mas, rememorando a pergunta, julgo que estava viciada na origem. Isto é, o verbo "dever" não se adequa à obra de arte. Manet não pensou certamente em escandalizar Napoleão III quando pintou Olímpia nua. A lição a tirar é que no processo artístico as intenções não contam, conta a inspiração que não é uma invenção romântica. Na arte não há deveres. E não me lembrei de o afirmar!

 

Produziu muito ao longo dos anos. O que é que acha que ficará? Aponte-me três quadros de que goste especialmente.

Não posso garantir que fique o que quer que seja. As escolhas são apanágio dos críticos e do público. O tempo encarrega-se da rectificação. Se for caso disso.

 

 

Publicado originalmente no Público em 2009