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Anabela Mota Ribeiro

Quest. Natal - Nuno Azevedo

22.12.14

Qual o presente que mais gostou de receber? A Pipi das Meias Altas, uma gravata Hermès, Dinky Toys? João Talone indicou um lanche com o Avô quando aprendeu a ler…

 

Um relógio, no final da minha licenciatura, que ainda uso diariamente.

 

Alexandre, o Grande, disse a Diógenes Laércio que este lhe podia pedir o que quisesse… Mas o filósofo respondeu apenas: “Quero que saias da frente porque me tapas o sol…”. Se lhe fosse dado a escolher o que quisesse, o que seria? (Paz, Amor e Saúde não contam!!)

 

Que o Sol faça sempre parte da vida dos meus filhos.

 

Um Natal celebrado fora da família: compras para a ceia no mercado de Rialto, um passeio de gôndola ao cair da noite, o labirinto de ruas e canais por uma vez deserto. Poderia permitir-se esta ousadia?

 

Não vejo a celebração do Natal fora da família como uma ousadia. Levar a família a passar o Natal em Veneza, vaguear pela noite dentro num labirinto de canais deserto, isso sim, seria uma ousadia. E não faz parte do inimaginável.

 

Um Natal celebrado em Família: os ciúmes entre irmãos que confirmam Abel e Caim, a cobiça sexual da cunhada como num filme de Woody Allen, os familiares que cobram os divórcios e os fracassos com impiedade. O Natal pode ser uma interminável lista de horrores. Que horrores pode contar?

 

Para ser sincero, não me parece alguma vez ter feito parte desse filme…Lembro-me, vagamente, que no pós 25 de Abril nem as rabanadas ajudavam a aproximar diferenças.

 

Outro Natal celebrado em família: a cozinha cheia de aromas, a caminhada até à missa do Galo, a excitação das crianças e dos presentes. «A vulgaridade é um lar», dizia Pessoa… O que é que no Natal é para si um lar?

 

No passado: uma lareira na noite fria, os meus avôs, as visitas ao longo do dia e um jogo de “quino” no final da noite. Hoje em dia: a brisa das noites quentes da Bahia, os meus filhos, o lado de lá do equador com o insuprível desajuste do imaginário natalício.

 

Maria de Lourdes Modesto gosta de fazer um bolo inglês para uma pessoa querida. Júlio Machado Vaz ofereceu uma página do seu diário a Eugénio de Andrade. Que presente gostaria de fazer com as suas mãos? Para oferecer a quem?

 

Um retrato da minha vida para oferecer à minha mãe.

 

“Do céu caiu uma estrela”, de Capra, ou “Fanny e Alexander”, de Bergman? A Menina dos Fósforos ou os personagens de Dickens? Pai Natal ou Menino Jesus? Abrir os presentes depois da Ceia ou na manhã de 25?

 

Bergman, Dickens, Pai Natal, depois da ceia.

 

No Natal, as crianças escrevem intermináveis listas de presentes que gostariam de receber. O que constava da última lista que escreveu?

 

Já não me lembro. Aliás, nem sei se alguma vez fiz uma lista de presentes.

 

“Entre por essa porta agora, e diga que me adora, você tem meia hora para mudar a minha vida”, canta Adriana Calcanhotto. Já esteve a pontos de mudar a sua vida em meia hora? E por acaso isso coincidiu com as Festas?

 

Já mudei várias vezes de vida, nunca o consegui fazer tão rápido… talvez numa passagem de ano.

 

O pior de começar o ano é: perceber que nada mudou? Ter de fazer uma dieta drástica para combater os estragos da saison? Perceber que a sogra, o rival e o medíocre continuam por perto?

 

O pior é mesmo ter que cumprir as promessas.

 

Ficar mais magro, deixar de fumar, inventar mais tempo para os filhos… As resoluções de Ano Novo entraram no anedotário universal! Já alguma vez cumpriu alguma? Quais são as fazíveis para 2008?

 

Já. Para 2008: deixar de fumar.

 

Para o ano novo vinha mesmo a calhar: um carro novo, um emprego novo, umas coxas novas, o Chico Buarque a morar no bairro, uma secretária parecida com a Laetitia Casta? Uma vida nova?

 

Deixar de fumar.

 

 

Publicado originalmente no Jornal de Negócios em 2007