Quest. Natal - Bragança de Miranda
Qual o presente que mais gostou de receber? A Pipi das Meias Altas, uma gravata Hermès, Dinky Toys? João Talone indicou um lanche com o Avô quando aprendeu a ler…
Um barco à vela de madeira, feito à escala, que me parecia enorme. Ainda tenho fotografias em que estou contente a vê-lo na água… sem se virar.
Alexandre, o Grande, disse a Diógenes Laércio que este lhe podia pedir o que quisesse… Mas o filósofo respondeu apenas: “Quero que saias da frente porque me tapas o sol…”. Se lhe fosse dado a escolher o que quisesse, o que seria? (Paz, Amor e Saúde não contam!!)
A Lâmpada de Aladino. Se ma derem, prometo usá-la melhor…
Um Natal celebrado fora da família: compras para a ceia no mercado de Rialto, um passeio de gôndola ao cair da noite, o labirinto de ruas e canais por uma vez deserto. Poderia permitir-se esta ousadia?
Não nesta encarnação…
Um Natal celebrado em Família: os ciúmes entre irmãos que confirmam Abel e Caim, a cobiça sexual da cunhada como num filme de Woody Allen, os familiares que cobram os divórcios e os fracassos com impiedade. O Natal pode ser uma interminável lista de horrores. Que horrores pode contar?
A proibição materna de jogar e no Natal o meu pai a tentar convencer-nos de que o Rapa não era um jogo…
Outro Natal celebrado em família: a cozinha cheia de aromas, a caminhada até à missa do Galo, a excitação das crianças e dos presentes. «A vulgaridade é um lar», dizia Pessoa… O que é que no Natal é para si um lar?
A miudagem a brincar.
Maria de Lourdes Modesto gosta de fazer um bolo inglês para uma pessoa querida. Júlio Machado Vaz ofereceu uma página do seu diário a Eugénio de Andrade. Que presente gostaria de fazer com as suas mãos? Para oferecer a quem?
Às vezes cozinho uns pastéis de bacalhau para a minha mãe.
“Do céu caiu uma estrela”, de Capra, ou “Fanny e Alexander”, de Bergman? A Menina dos Fósforos ou os personagens de Dickens? Pai Natal ou Menino Jesus? Abrir os presentes depois da Ceia ou na manhã de 25?
Cairia mais do que uma estrela se não fossem abertos depois da ceia…
No Natal, as crianças escrevem intermináveis listas de presentes que gostariam de receber. O que constava da última lista que escreveu?
Nesse tempo não se escreviam listas…, éramos alistados.
“Entre por essa porta agora, e diga que me adora, você tem meia hora para mudar a minha vida”, canta Adriana Calcanhotto. Já esteve a pontos de mudar a sua vida em meia hora? E por acaso isso coincidiu com as Festas?
Já. Abandonei medicina entre dois autocarros. Bem, lá dizia-se machimbombos. Não coincidiu de facto, mas foi uma festa…
O pior de começar o ano é: perceber que nada mudou? Ter de fazer uma dieta drástica para combater os estragos da saison? Perceber que a sogra, o rival e o medíocre continuam por perto?
Não temos que começar nada. Vamos continuando. .. entre o perto e o longe.
Ficar mais magro, deixar de fumar, inventar mais tempo para os filhos… As resoluções de Ano Novo entraram no anedotário universal! Já alguma vez cumpriu alguma? Quais são as fazíveis para 2008?
Só faço resoluções no meu aniversário. Já cumpri algumas delas… mas não eram nada de napoleónico.
Para o ano novo vinha mesmo a calhar: um carro novo, um emprego novo, umas coxas novas, o Chico Buarque a morar no bairro, uma secretária parecida com a Laetitia Casta? Uma vida nova?
Sinto a falta de um bom café, espaçoso e com mesas afastadas para ir estando. Mas o Chico Buarque com coxas novas faz-me hesitar... Decido-me: «Vinha mesmo a calhar um café novo no meu bairro».
Publicado originalmente no Jornal de Negócios em 2007