Curso de Cultura Geral - 15 Abril 2018
Imaginem um explorador alemão na América do Sul no século XVIII. Um homem de apetite voraz pelo mundo, que condensou numa obra, Kosmos, um imenso saber, e que se interessava por tudo. Da biologia à antropologia, dos vulcões à política. Para ele, a cultura era mesmo geral e as disciplinas não eram estanques. Alexander von Humboldt é o seu nome e é um dos ídolos da bióloga Patrícia Garcia Pereira, especialista em borboletas. Outro sujeito voraz: João Guimarães Rosa. Foi diplomata na Alemanha na Segunda Guerra, passou vistos que salvaram vidas (como o nosso Aristides Sousa Mendes), escreveu um livro que é, segundo ele, uma espécie de Fausto no Sertão brasileiro. Grande Sertão: Veredas é, coincidência, um livro central para duas convidadas do programa de hoje: a escritora Alexandra Lucas Coelho e Rita Natálio, também escritora e performer. Podíamos passar horas a discutir o universo, a linguagem, tudo o que há em Guimarães Rosa, mas aponto apenas duas frases: “Mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende”. E: “Viver é negócio muito perigoso”.
A lista de Alexandra Lucas Coelho, escritora*
- Davi Kopenawa/Bruce Albert, A Queda do Céu;
- Um volume da Recherche (“Sodoma e Gomorra”), Proust;
- Le Clézio, Le rêve méxicain;
- Guimarães Rosa, Grande Sertão: Veredas;
- Épico de Gilgamesh, tradução Francisco Luís Parreira e tradução de Pedro Tamen;
- Herberto, Photomaton & Vox;
- Orlando, Virginia Woolf.
A lista de Patrícia Garcia Pereira, bióloga
- Castro Verde: onde passei férias nas escavações arqueológicas dos meus tios em criança;
- Museo Nacional de Ciencias Naturales de Madrid. Passei 10 meses no museu a trabalhar com a colecção de borboletas;
- Avis: tem imensas potencialidades para trabalhar na construção de uma sociedade mais ecológica, mais sábia, mais rica e mais confortável para viver;
- Fernando Catarino, Professor de Botânica da FCUL, já jubilado;
- Alexander Von Humboldt, um homem do séc. XVIII que junta Física, Geologia, Botânica, Antropologia e Política;
- Edward O. Wilson é o Humboldt do presente. Inventou a palavra Biodiversidade;
- Vandana Shiva: feminista, activista política, dedicou-se à conservação das sementes silvestres da Índia e escola para a promoção da agricultura em pequena escala, muito para mulheres;
- Floresta sintrópica: conceito que se baseia na junção de agricultura com floresta. A principal figura é Ernst Götsch, um suíço que foi para o Brasil há mais de 40 anos aplicar os seus princípios a uma fazenda;
- Rewilding Europe: podemos viver melhor se conseguirmos criar espaços selvagens em que não há intervenção humana. Não se trata de um retrocesso social, mas de uma forma de promover o conhecimento e contacto das pessoas com a natureza;
- Nabokov, já nos EUA, e antes de se tornar famoso como escritor, trabalhou no departamento de entomologia do Museu de Harvard. Fez desenhos.
A lista de Rita Natálio, performer e escritora**
- Descobrir Clarice Lispector, particularmente A Paixão segundo G.H. que deu origem a uma peça que realizei em 2012, "Não entendo e tenho medo de entender, o mundo assusta-me com os seus planetas e baratas";
- Ida para o Brasil em 2012. Uma viagem a Alter do Chão, no Pará, onde desenvolvi parte do projeto "Museu Encantador";
- Descobrir a antropologia de Viveiros de Castro e Tania Stolze Lima, o activismo poético de Ailton Krenak e a sabedoria de Davi Kopenawa;
- A minha primeira experiência em terreiros de Candomblé;
- Conhecer o cinema indígena nas aldeias, Corumbiara e Martírio de Vincent Carelli, que iniciou este projeto do vídeo nas aldeias nos anos 80;
- Ler em voz alta integralmente Grande Sertão: Veredas para a minha parceira;
- Ter lido e entrevistado Alberto Pimenta e Ana Hatherly;
- Enrolar-me na escrita de Gilles Deleuze;
- O choque de ler Artaud na adolescência, os Tarahumaras e Para acabar com o juízo de Deus.
*A escritora preferiu que a sua lista fosse de sete elementos.
**A convidada preferiu que a sua lista fosse de nove elementos.