Anabela Mota Ribeiro

O que é o Natal? É amor, é o nascimento de Jesus, é a família reunida à volta do bacalhau? Que família? Nos últimos 28 dias, no Calendário do Advento, procurámos as muitas faces do Natal, neste tempo de preparação e espera. Mais religiosas, mais ritualizadas, diversos credos e referências culturais, homens e mulheres de várias gerações. Tentando compreender: porque é que este dia não é mais um dia, e porque é que os mitos do Natal são aqueles que fundeiam a nossa vida. Para terminar, escolhi uma família. Um pai e um filho. Um filho que nasceu em 2005, um pai que tinha 36 quando se encontrou com a cara de Sandro. O menino tinha dois anos. Jorge trabalha em seguros e foi produtor teatral. Sandro é estudante e foi um dos protagonistas da peça Casa Portuguesa, encenação de Pedro Penim para o Teatro Nacional D. Maria.

Sobrinho Simões é um professor de medicina que gosta muito de patologia. Em 2015 foi eleito o patologista mais influente do mundo. Trata doenças, não doentes. É de uma família de médicos, foi treinado a perguntar: porquê? Sofreu um AVC em 2018 e a pergunta passou a ser: para quê? É professor catedrático da Universidade do Porto, onde criou, em 1989 o IPATIMUP. Tem três filhos, sete netos. Para ele a pior coisa que há é a solidão. O melhor é a relação com os outros, o contacto com a comunidade.

Susana Sardo é etnomusicóloga. Ou seja, trabalha sobre músicas étnicas. Não apenas sobre músicas exóticas feitas em locais recônditos. Mas sobre todas as músicas. Étnicas porque todas são feitas por pessoas. Estudou piano, é professora da universidade de Aveiro. Os seus interesses de investigação incluem música em Goa e nas comunidades diaspóricas, música e pós-colonialismo, música no espaço lusófono. Pela sua mão, e através da música, vamos ao hinduísmo, falamos do Divali, ficamos a conhecer instrumentos musicais como o Gumatt. A primeira viagem a Goa foi em 1987.

Gregorio Duvivier é cristão, apesar de ateu. Num episódio incendiário da Porta dos Fundos, deu corpo a um Jesus que vive um romance gay. Foi em 2019. No ano anterior, o colectivo brasileiro fez uma sátira da última ceia, e dessa vez Gregorio foi Judas e Fábio Porchat Jesus. Chamava-se: Se beber não ceie. Este ano, Gregório voltou a ser Jesus, mas um Jesus desempregado, porque o especial de Natal da Porta vai ser um filme de terror. O que mais importa: porque é que o Natal, Jesus, os temas religiosos são tão irresistíveis para os humoristas? E há cabimento para palavras como blasfémia ou ofensa?

“Eu só comecei a filmar, quando era miúda, porque a minha avó começou a ficar doente e eu disse à minha mãe: “a avó vai morrer, devíamos filmar porque vamos sentir muitas saudades”. Nós devíamos guardar a vida. Eu vou morrer e os filmes ficam cá, estas pessoas ficam eternamente no cinema. E talvez isto de fintar a morte seja o que mais me interessa”. Esta menina, Cláudia Varejão, filma a vida e filma as muitas faces do amor. Nasceu em 1980 no Porto, entre o granito e a natureza agreste. Cresceu num colégio católico. Traz sempre consigo mini-retratos que compõem um álbum portátil das pessoas que ama.

Fala pintando, desenhando. Na cabeça de Graça Morais está a história de uma aldeia. Vieiro, em Trás os Montes. Está a mãe da pintora, a sua musa. Estão as memórias da infância, a sua impressão digital. No desenho e na pintura, encontramos a terra quente, a mulher transmontana, figuras que parecem personagens de uma tragédia antiga, a sexualidade e a morte, os animais, o medo da natureza, uma cosmogonia singular. Palavras como robusta, violência, a terra, as fragas, os mitos ajudam-nos a entrar nos mistérios desta criadora.