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Anabela Mota Ribeiro

Zé Diogo Quintela (Quest. Proust)

01.08.13

Proust disse que uma necessidade de ser amado e cuidado era a sua característica mais marcante. Mais do que ser admirado. Qual é a sua?

A necessidade de ser apreciado pelo que sou, não pela minha beleza. Uma luta diária e angustiante.

 

Qual é a qualidade que mais aprecia num homem? Proust falou de “charme feminino”...

Honestidade

 

E numa mulher? Ele mencionou “franqueza na amizade” – golpe baixo para as mulheres ou sagaz comentário?

Honestidade e um peito bonito.

 

Ternura, desde que acompanhada de um charme físico..., era o valor mais precioso nas amizades de Proust. E nas suas?

Paciência.

 

Vontade fraca e incapacidade para entender, foi a resposta que deu quando lhe perguntaram qual era o seu principal defeito. Partilha destes defeitos? E que outros pode apontar?

Deve ser mesmo a única coisa em que sou parecido com o Proust. A isso acrescento: preguiça moral.

 

Qual é a sua ocupação favorita? Amar, disse ele...

Não fazer nada, literalmente.

 

Qual é o seu sonho de felicidade? A resposta de Proust é esquiva: não fala de molhar madalenas no chá e diz que não tem coragem de o revelar... Mas que não é grandioso e que se estraga se for posto em palavras. O que é que compõe o seu quadro de felicidade?

Ele não tinha era resposta. O meu sonho de felicidade é dormir bem todos os dias.

 

O que é que na sua cabeça seria a maior das desgraças? Proust respondeu, aos 20 anos: “Nunca ter conhecido a minha mãe e a minha avó”. Mas aos 13 respondeu apenas quando lhe perguntaram pela maior dor: “Ser separado da mamã”.

Sobreviver às pessoas de quem gosto.

 

Quando lhe perguntaram o que é que gostaria de ser, respondeu: “Eu mesmo”, aos 20, e Plínio, o Novo, aos 13. As suas respostas seria diferentes? Quem gostaria de ter sido aos 13 anos? E agora?

Aos 13 gostava de ter sido o Manel Fernando, o miúdo da minha aula que melhor jogava à bola. Agora não sei quem gostava de ser. Sei que não gostava de ser o Manuel Fernando, pois já faleceu.

 

Proust gostaria de viver num país onde a ternura e os sentimentos fossem sempre correspondidos. O país onde gostaria de viver existe deveras? Onde fica?

Gostava de viver na Nicarágua. (só um momento, que estou a abrir a wikipédia). Fica na América Central, entre as Honduras e a Costa Rica.

 

Quais são os seus escritores preferidos? No momento em que respondeu, Proust lia com especial prazer Anatole France e Pierre Loti.

No momento em que respondo, leio com prazer Phillip Roth e Evelyn Waugh. Não ao mesmo tempo, evidentemente. Apesar de, se quisesse, o poder fazer, uma vez que sou estrábico.

 

E os poetas? Ele mencionou dois, e um deles faz parte das listas eternas: Baudelaire.

No momento em que respondo, não leio poesia. Mas se o Baudelaire é assim tão bom, pode ficar na minha lista.

 

Qual é o seu herói de ficção preferido? Aos 13 anos, Proust falou de Sócrates e Maomé como figuras históricas de eleição... E aos 20, referindo-se às mulheres, elegeu Cleópatra.

Desde sempre gostei muito do Fernão Magalhães. É, claramente, um predestinado: quais são as probabilidades de se encontrar, no cu do mundo, um estreito com o próprio nome?

 

Quem é o seu compositor preferido? Aos 13 anos, escreveu Mozart, aos 20 Beethoven, Wagner, Schumann. Mas Proust não podia conhecer Tom Jobim ou Cole Porter...

Brian Wilson.

 

Proust não foi contemporâneo de Rothko. E escolheu Da Vinci e Rembrandt como pintores favoritos.

Do nada que sei de pintura, sei que gosto muito de Gauguin. Tem cores bonitas.

 

Quem são os seus heróis da vida real? Ele apontou dois professores.

Uma vez também apontei a um professor, mas falhei. Na vida real, admiro bastante quem gosta de mim.

 

“Das minhas piores qualidades”, respondeu o escritor da “Recherche” quando lhe perguntaram do que gostava menos. E no seu caso?

De couve-flor e beringelas.

 

Que talento natural gostaria de ter? As respostas de Proust são óptimas: “Força de vontade e charme irresistível”!

Força para levantar, em supino deitado, mais de 150 kg.

 

Como gostaria de morrer? “Um homem melhor do que sou, e mais amado”.

Sem perceber.

 

Qual é o seu actual estado de espírito? “Aborrecido. Por ter que pensar acerca de mim mesmo para responder a este questionário”. Pensar em quem é traz-lhe aborrecimento?

No meu vizinho de baixo.

 

Proust era condescendente em relação às faltas que conseguia compreender. Quais são aquelas que irreleva?

Normalmente condescendo naquilo em que também falho. Portanto, lido bem com o erro dos outros.

 

Por fim, preferiu não responder qual era o seu lema, temendo que isso lhe trouxesse má sorte... É supersticioso como Proust? O que é que o faz correr?

O meu lema, já desde há alguns anos, é “viver cada dia como se fosse terça-feira”.

 

 

Publicado originalmente no Jornal de Negócios no Verão de 2010