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Anabela Mota Ribeiro

Guta Moura Guedes (Quest. Proust)

18.08.13

Proust disse que uma necessidade de ser amado e cuidado era a sua característica mais marcante. Mais do que ser admirado. Qual é a sua?

Tenho a dupla necessidade de ser entendida e questionada. Mas a característica mais forte é ser  50% de emoção, 50% de racionalidade e ter uma muito escassa imunidade à maldade.

 

Qual é a qualidade que mais aprecia num homem? Proust falou de “charme feminino”...

Generosidade e ternura. Mas não consigo passar sem a inteligência e sem um forte sentido de humor. E inquietação. Não suporto homens acomodados.

 

E numa mulher? Ele mencionou “franqueza na amizade” – golpe baixo para as mulheres ou sagaz comentário?

Admiro a capacidade de sacrifício e a frieza clínica das mulheres. E  a forma como sentem a vida e como se dão a ela.

 

Ternura, desde que acompanhada de um charme físico..., era o valor mais precioso nas amizades de Proust. E nas suas?

Nas amizades? Sinceridade e fidelidade. Brilho. Presença e constância, mesmo se longe.

 

Vontade fraca e incapacidade para entender, foi a resposta que deu quando lhe perguntaram qual era o seu principal defeito. Partilha destes defeitos? E que outros pode apontar?

Não, esses não são os meus defeitos. Sou impaciente, teimosa e algo irregular. Mas na verdade, não acho estes dois últimos defeitos...

 

Qual é a sua ocupação favorita? Amar, disse ele...

Amar, digo eu.

 

Qual é o seu sonho de felicidade? A resposta de Proust é esquiva: não fala de molhar madalenas no chá e diz que não tem coragem de o revelar... Mas que não é grandioso e que se estraga se for posto em palavras. O que é que compõe o seu quadro de felicidade?

Coisas básicas. Estar viva e estarem vivos os que eu amo. Estarmos bem e de saúde e juntos.

 

O que é que na sua cabeça seria a maior das desgraças? Proust respondeu, aos 20 anos: “Nunca ter conhecido a minha mãe e a minha avó”. Mas aos 13 respondeu apenas quando lhe perguntaram pela maior dor: “Ser separado da mamã”.

Perder os meus filhos.

 

Quando lhe perguntaram o que é que gostaria de ser, respondeu: “Eu mesmo”, aos 20, e Plínio, o Novo, aos 13. As suas respostas seria diferentes? Quem gostaria de ter sido aos 13 anos? E agora?

Eu mesma, sempre.

 

 

 

Proust gostaria de viver num país onde a ternura e os sentimentos fossem sempre correspondidos. O país onde gostaria de viver existe deveras? Onde fica?

Não sei de países perfeitos. Sei de sítios perfeitos porque as pessoas que admiro e gosto estão lá. Sei de outros porque precisamente ninguém está lá, só o espaço, o mar, o verde, a ruas, as portas, as cores, o cheiro.

 

Quais são os seus escritores preferidos? No momento em que respondeu, Proust lia com especial prazer Anatole France e Pierre Loti.

Proust, Lobo Antunes, Faulkner,  Martin Amis, Hemingway, Calvino, Saramago, Steinbeck, Montaigne, Suskind, Roth, Eco, Eça, muitos.

 

E os poetas? Ele mencionou dois, e um deles faz parte das listas eternas: Baudelaire.

Fernando Pessoa e Herberto Hélder

 

Qual é o seu herói de ficção preferido? Aos 13 anos, Proust falou de Sócrates e Maomé como figuras históricas de eleição... E aos 20, referindo-se às mulheres, elegeu Cleópatra.

Não tenho heróis de ficção favoritos. Acredito em momentâneos actos heróicos, não em heróis.

 

Quem é o seu compositor preferido? Aos 13 anos, escreveu Mozart, aos 20 Beethoven, Wagner, Schumann. Mas Proust não podia conhecer Tom Jobim ou Cole Porter...

Bach. Antes, agora e depois.

 

Proust não foi contemporâneo de Rothko. E escolheu Da Vinci e Rembrandt como pintores favoritos.

Agnés Martin, Gerard Richter, Luc Tuymans, Rothko. 

 

Quem são os seus heróis da vida real? Ele apontou dois professores.

Os meus pais.

 

“Das minhas piores qualidades”, respondeu o escritor da “Recherche” quando lhe perguntaram do que gostava menos. E no seu caso?

Mentira, falsidade, segundas intenções, opacidade, mediocridade, umbiguismo, intolerância, egoísmo, escuridão, ambiguidade, crueldade, arrogância, abandono, indecisões, preconceitos, negligência, agressividade, pequenez, moleza e falta de garra.

 

Que talento natural gostaria de ter? As respostas de Proust são óptimas: “Força de vontade e charme irresistível”!

Gostava de ter uma memória fabulosa. Sou uma desgraça, esqueço-me dos nomes, só me lembro das caras, esqueço-me das ruas e das cidades, só me recordo da luz, da temperatura, do som e da comida dos sítios....

 

Como gostaria de morrer? “Um homem melhor do que sou, e mais amado”.

De uma vez só. E melhor do que sou agora.

 

Qual é o seu actual estado de espírito? “Aborrecido. Por ter que pensar acerca de mim mesmo para responder a este questionário”. Pensar em quem é traz-lhe aborrecimento?

Não me custa nada pensar em quem sou. Como estou agora? Curiosa. Esse é um estado de espírito que me acompanha sempre.

 

Proust era condescendente em relação às faltas que conseguia compreender. Quais são aquelas que irreleva?

Orgulho e ciúme.

 

Por fim, preferiu não responder qual era o seu lema, temendo que isso lhe trouxesse má sorte... É supersticioso como Proust? O que é que o faz correr?

Não sou supersticiosa. Faz-me correr o prazer  e a felicidade que tenho em estar viva. 

 

 

Publicado originalmente no Jornal de Negócios no Verão de 2010