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Anabela Mota Ribeiro

Pedro Mexia (Quest. Proust)

01.09.13

Proust disse que uma necessidade de ser amado e cuidado era a sua característica mais marcante. Mais do que ser admirado. Qual é a sua?

 

Temo que a minha característica mais marcante seja ser muito pouco marcante.

 

Qual é a qualidade que mais aprecia num homem? Proust falou de “charme feminino”...

 

Lealdade. E uma gestão sensata da agressividade.

 

E numa mulher? Ele mencionou “franqueza na amizade” – golpe baixo para as mulheres ou sagaz comentário?

 

«Charme feminino», mas não especialmente «sedução feminina».

 

Ternura, desde que acompanhada de um charme físico..., era o valor mais precioso nas amizades de Proust. E nas suas?

 

A soma das respostas anteriores.

 

Vontade fraca e incapacidade para entender, foi a resposta que deu quando lhe perguntaram qual era o seu principal defeito. Partilha destes defeitos? E que outros pode apontar?

 

Dos «pecados mortais» o meu mais mortal é a preguiça.

 

Qual é a sua ocupação favorita? Amar, disse ele...

 

«Amar» é caricato como «ocupação». Passo muito tempo a ler, e não trocava por quase nada.

 

Qual é o seu sonho de felicidade? A resposta de Proust é esquiva: não fala de molhar madalenas no chá e diz que não tem coragem de o revelar... Mas que não é grandioso e que se estraga se for posto em palavras. O que é que compõe o seu quadro de felicidade?

 

Não tenho sonhos quando estou acordado. E raramente uso a palavra «felicidade».

 

O que é que na sua cabeça seria a maior das desgraças? Proust respondeu, aos 20 anos: “Nunca ter conhecido a minha mãe e a minha avó”. Mas aos 13 respondeu apenas quando lhe perguntaram pela maior dor: “Ser separado da mamã”.

 

A maior desgraça é perdermos as pessoas que amamos. Ou as coisas que amamos, como, no meu caso, a minha biblioteca.

 

Quando lhe perguntaram o que é que gostaria de ser, respondeu: “Eu mesmo”, aos 20, e Plínio, o Novo, aos 13. As suas respostas seria diferentes? Quem gostaria de ter sido aos 13 anos? E agora?

 

Aos 13 anos alguém aventureiro. Aos 34, alguém tranquilo mas com talento.

 

Proust gostaria de viver num país onde a ternura e os sentimentos fossem sempre correspondidos. O país onde gostaria de viver existe deveras? Onde fica?

 

Um país onde os sentimentos fossem sempre correspondidos seria um colónia penal. Não gosto de países metafóricos. Gosto de viver em Lisboa.

 

Quais são os seus escritores preferidos? No momento em que respondeu, Proust lia com especial prazer Anatole France e Pierre Loti.

 

Beckett, Kierkegaard, Pavese, Eliot, Tchekhov, porque foram os primeiros cinco em quem pensei.

 

E os poetas? Ele mencionou dois, e um deles faz parte das listas eternas: Baudelaire.

 

Eliot. Mais quatro em quem pense de imediato: Baudelaire, Wallace Stevens, Cavafis, Camões.

 

Qual é o seu herói de ficção preferido? Aos 13 anos, Proust falou de Sócrates e Maomé como figuras históricas de eleição... E aos 20, referindo-se às mulheres, elegeu Cleópatra.

 

Não gosto especialmente de «heróis», mas há um «protagonista» com quem empatizo: Krapp, o velho que ouve memórias em bobines na peça de Beckett Krapp’s Last Tape.

 

 

Quem é o seu compositor preferido? Aos 13 anos, escreveu Mozart, aos 20 Beethoven, Wagner, Schumann. Mas Proust não podia conhecer Tom Jobim ou Cole Porter...

 

Compositor clássico, Schubert. «Songwriter» contemporâneo, Leonard Cohen.

 

Proust não foi contemporâneo de Rothko. E escolheu Da Vinci e Rembrandt como pintores favoritos.

 

Os cinco primeiros que me ocorrem: Vermeer, Hopper, Magritte, Mondrian, De Stael.

 

Quem são os seus heróis da vida real? Ele apontou dois professores.

 

Admiro muita gente, especialmente os corajosos.

 

“Das minhas piores qualidades”, respondeu o escritor da “Recherche” quando lhe perguntaram do que gostava menos. E no seu caso?

 

Abomino a mentira cruel, incluindo as mentiras «misericordiosas».

 

Que talento natural gostaria de ter? As respostas de Proust são óptimas: “Força de vontade e charme irresistível”!

 

Aspas aspas na resposta do Marcel.

 

Como gostaria de morrer? “Um homem melhor do que sou, e mais amado”.

 

Que depois se lembrassem de mim como um tipo decente.

 

Proust era condescendente em relação às faltas que conseguia compreender. Quais são aquelas que irreleva?

 

Nisso, sou como um confessor: quase todas as «faltas», num determinado contexto, podem ser perdoadas.

 

Por fim, preferiu não responder qual era o seu lema, temendo que isso lhe trouxesse má sorte... É supersticioso como Proust? O que é que o faz correr?

 

Não sou supersticioso, mas gosto de números redondos e efemérides.

 

 

Publicado originalmente no Jornal de Negócios no Verão de 2010