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Anabela Mota Ribeiro

Diogo Vasconcelos

10.05.15

Por vezes, a conference call é interrompida pelo latido de um cão, que chega das ruas estreitas onde fica a casa de Diogo Vasconcelos. Quem está do outro lado do ecrã, eventualmente num mundo asséptico de paredes de vidro, onde o futuro é agora e não amanhã, fica surpreendido pelo insólito da situação.

A casa é na Foz Velha, no Porto, e da janela da sala vê-se um resto de rio que desagua no mar. Não há elevador. Não são muitos os homens com o destino social de Diogo Vasconcelos ou a sua trajectória profissional que vivam num prédio sem elevador. Uma tela de uma jovem artista plástica portuguesa domina o espaço onde nos encontramos. Há uma parede cheia de livros. Há a descontracção de quem serve água da torneira nuns copos tipicamente portugueses. Apesar de esta não ser a casa de todos os dias, desde há quatro anos, não parece uma casa por habitar ou impessoal.

Diogo Vasconcelos usa-a como base em Portugal. Mudou-se para Londres onde é o nosso homem na Cisco. Continua a ser o homem de Cavaco para o mundo digital. Do seu jargão constam palavras como inovação, mudança, empowerment. Do que fala é de risco, de desafio, da criatividade explosiva da capital libanesa. Da construção de uma sociedade menos “para” as pessoas e mais “com” as pessoas. Essa é uma das suas formas de intervenção na esfera pública.

Nasceu no Porto em 1968. Uma das atribuições do seu departamento na Cisco é perceber em que direcção é que vamos, captar as tendências. Se quiserem saber mais sobre o futuro, perguntem-lhe.

 

Quando é que aprendeu que “we are what we share”? É uma máxima que aponta na sua página na net.

Essa frase pressupõe que o mundo em que vivemos pode ser melhorado. Pressupõe uma visão insatisfeita sobre a realidade em que vivemos. Mas pressupõe também que o futuro já cá está de forma embrionária. É nossa obrigação partilhar alguns desses indícios, para que isso possa dar origem a novas formas de ver, de fazer. O mundo progride com novo conhecimento, com novas tensões.

 

Nunca partimos do zero.

É algo que uns entendem como imutável, outros entendem como plástico. Sendo possível de ser transformado, se formos capazes de partilhar, podemos dar origem a coisas imprevisíveis que inspiram outros, que causam alerta, que levam as pessoas a pensar.

 

Há um fundo utópico nesta frase?

As pessoas diziam: “Somos o que pensamos” – cogito ergo sum. Mas isso era numa fase em que as pessoas viviam de forma atomizada, em círculos restritos. No mundo em que as pessoas estão em rede, a partilha faz com que surjam novas oportunidades de inovação social. We are what we share significa que, ao contrário do mundo físico, quando partilhamos conhecimento, ele aumenta. Identifico-me com essa frase, mas ela não é minha, é do Charles Leadbeater, do We think. É uma pessoa de quem sou bastante amigo e que trouxe a um congresso da APDC.

 

We think, e não we share.

Isto pressupõe uma sociedade pluralista, com muitas formas diferentes de ver, e uma atitude de inconformismo. A partilha leva ao empowerment, e quanto mais o poder for distribuído, mais possibilidades há de inovação. Inovação é mudança.

 

O que é que pode traduzir essa mudança?

Dar às pessoas poder para que construam o seu próprio destino, atinjam o seu potencial, criem um mundo diferente. Esse mundo diferente não é utópico – é possível.

 

Fale-me disso aplicado a si. Quando é que teve a noção de que estas eram as suas competências, como é que chegou a estas convicções, porque é que estes são os seus temas?

Tive um certo impulso e vontade de participar desde miúdo. Na Escola Preparatória de Paranhos, com um amigo, fiz um jornal, fotocopiado no emprego do pai, Passo a Passo, que levávamos a sério. Quando fui para o Liceu António Nobre, relancei um jornal que existia, impresso no antigo FAOJ, O Brecha – passou a ser Nova Brecha – que procurou mexer com a escola. Achei que pôr as pessoas a reflectir através de artigos não chegava, e que era possível ter formas mais activas de participação. Com outras pessoas, concorremos à associação de estudantes, ganhámos e colaborámos com outras associações. Daí fui para a [Universidade] Católica, fazer o ano zero, e passado pouco tempo convidaram-me para a associação de estudantes. Quando passei a presidente da associação, uma das coisas mais importantes que fizemos foi uma avaliação de todos os professores. Chamava-se “O curso que temos, o curso que queremos”. Criámos a Federação Académica do Porto, uma voz representativa das associações do Porto, numa lógica para além das questões partidárias.

 

De onde vem esse gérmen da intervenção?

Política era uma coisa discutida à mesa todos os dias, com grande paixão. Os meus pais tiveram participação política activa. Foram ambos muito activos antes do 25 de Abril, na Acção Católica. E depois, por imperativo cívico, foram militantes fundadores do PPD. Antes disso tinham sido fundadores da SEDES. Sempre houve esse código genético, participativo. As pessoas têm obrigação de contribuir para a sociedade e não apenas cingirem-se ao seu âmbito pessoal ou profissional.

 

No microcosmos do Porto, as pessoas que intervêm são sempre mais ou menos as mesmas. Vivem na Foz, os filhos estudam na Católica, frequentam Serralves e o Teatro São João.

Esse estereótipo não corresponde à verdade. Não me sinto integrado num clube fechado do Porto, e há quatro anos que não vivo cá. Gosto muito da cidade do Porto, é uma cidade que precisa de alguma renovação, do ponto de vista das suas elites; mas isso é um problema que não é só do Porto, é do país.

Fui para a Católica, e ainda bem que fui; era na altura o único curso de Direito disponível no Porto.

 

Os seus pais educaram-no para ser o quê? Foi líder, aglutinador. Mesmo nas experiências escolares teve sempre um papel preponderante.

Não há nenhuma pré-intenção. Foi uma educação de quem acha que certos valores são importantes, e procurou passá-los para mim e para os meus irmãos. Talvez tenha havido um ambiente que proporcionou uma…

 

Ousadia?, confiança?

Admito que sim. [Alimentaram] a ideia de que não devemos passar pela vida sem tentar uma transformação. Há muita gente que tem uma ideia da vida numa lógica mais consumista. Penso que a obrigação de cada um é tentar criar condições para que algo fique melhor, em todas as esferas. Nunca tive planos, foi acontecendo naturalmente.

 

A área de intervenção estava definida à partida? Quando foi estudar Direito era para ser advogado?

Pensei estudar Comunicação, sempre tive uma atracção grande pelos media. Achei que o curso de Direito, mesmo para isso, era mais adequado. Abria, em vez de fechar possibilidades. Em Inglaterra, o meu chefe tem formação em Filosofia. Há muitos directores de empresa cuja formação é História, Estudos Clássicos. Em Portugal isso seria um escândalo. Tinha que ser um gestor, um engenheiro, um jurista. Continuam a identificar-se muito os cursos com a profissão. O curso de Direito proporcionou elasticidade mental, um entendimento sobre a forma como funciona a sociedade, o mercado. Foi um curso que me agradou bastante, pelos professores, pelo ambiente, pelas oportunidades de participação. E pela instituição, com a qual me identifico bastante e a que continuo ligado.

 

Já antes se tinha aberto ao mundo e percebido que não existia uma correspondência directa entre a formação das pessoas e o objecto do seu trabalho. Mas Londres, nestes quatro anos, potenciou essa aprendizagem.

Londres é uma cidade onde as pessoas não são discriminadas em função do sítio onde nasceram. É muito estratificada do ponto de vista social. Apesar de tudo, é maior a mobilidade social do que em Portugal. É uma cidade aberta no sentido em que o que importa é debater ideias. As ideias novas são acolhidas com entusiasmo, com o sentido de que vale a pena aprofundá-las. Sinto uma respiração intelectual que é proporcional ao carácter global da cidade. Existe também uma cultura política muito aberta ao risco e à experimentação.

 

O que é que franqueia a porta, e o que é que não franqueia a porta em Portugal?

Portugal é uma sociedade assente na protecção do que existe. Das ideias que existem, das pessoas que existem, das empresas que existem. Inglaterra preocupa-se em dar espaço, não só às ideias prevalecentes de hoje, mas às ideias que estão a fazer o seu caminho, e que numa primeira fase são ignoradas, numa segunda fase são desprezadas, e numa terceira fase são tidas como evidentes.

 

Em Portugal não se correm riscos. Insistimos em pressupostos atávicos.

Existe em Portugal a ideia política, que ainda não está ultrapassada, de que o mercado cria riqueza e o Estado gasta. A visão, à esquerda, é de que o Estado garante a nossa felicidade, e que devemos ter cada vez mais serviços públicos. À direita, a ideia é a de que tudo deve passar pelo mercado, e que devemos ter menos impostos. Ambas as correntes assentam numa falsa ideia de meritocracia. Para a esquerda essa meritocracia é do Estado, para a direita é do mercado. Mas é possível criar riqueza e ao mesmo tempo dar resposta às necessidades sociais. A grande revolução que há a fazer é ultrapassar esta dicotomia entre Estado e mercado. O colectivismo e o individualismo são duas faces da mesma moeda.

 

Em Inglaterra essa síntese está mais convenientemente feita?

Acho que se está no caminho para se fazer essa síntese. As pessoas têm a consciência de que num mundo em que somos o que partilhamos, o futuro não se resolve, nem se cria, nem se delega na mão dos experts. No limite significa que se legitima, do lado do Estado, o “desempowerment” das pessoas (“alguém decide sempre em meu nome”); e do lado do mercado legitima-se um certo crescimento das desigualdades, que se deve combater. Essa síntese passa por uma sociedade muito mais autónoma em que as pessoas tomem o destino nas suas próprias mãos, e em que a democracia seja vivida no sentido de permitir a experimentação de novas formas de participação.

 

Tudo isso que diz encaixa no slogan “Despeça-se já!”, que foi a sua bandeira há uns anos. Ter o destino nas próprias mãos não é senão uma forma de empowerment.

Com uma ideia de liberdade. É a ideia de que as pessoas não devem ser consumidores passivos mas cidadãos activos na construção do seu destino e do destino colectivo.

 

Em todo o caso, essa ideia continua a ser esdrúxula num país como Portugal.

Porquê? É uma ideia mais necessária que nunca.

 

Se perguntar a um português se prefere ter um ordenado fixo no fim do mês, ou se prefere ser gerador do seu próprio trabalho, e viver na oscilação que daí possa resultar, diria que uma parte substancial dos inquiridos prefere a primeira opção. Aquilo que defende é o oposto disso, é o modo da responsabilização.

Não estou a defender que toda a gente seja empreendedora, ou que toda a gente crie o seu próprio emprego. Estou a defender é que as pessoas tenham capacidade de pôr o seu talento ao serviço da comunidade. A cultura política dominante em Portugal é uma cultura de condicionamento ao sentido de risco e de aventura, que foi agravada pela lógica dos últimos anos. Há uma ilusão perigosa de um futuro garantido pelo Estado. Essa ilusão não é comum a toda a gente. A prova disso são as centenas de milhares de pessoas que estão a abandonar Portugal e que não se identificam com essa visão. O grande perigo de Portugal é ficar como a Itália, em que há uma emigração maciça. No sítio onde moro tenho imensos vizinhos italianos, que saíram porque a Itália virou uma gerontocracia: as pessoas estão limitadas por quem conhecem e não pela competência do que fazem.

As pessoas podem ser empreendedoras trabalhando por conta de outrem. Neste momento trabalho por conta de outrem e sinto-me igualmente empreendedor. Para que isso aconteça é preciso outro tipo de organizações, que não as organizações muito baseadas na hierarquia, no título profissional. Isto leva-nos à segunda dimensão desta questão, à ideia de que existe uma capacidade de colaboração em massa e de produção descentralizada.

 

Esse é o novo paradigma?

É. A web não é mais do que a expressão desse paradigma, de as pessoas poderem criar colectivamente. Na semana passada organizei uma iniciativa em Amesterdão através do Dialogue Cafe (que é um projecto que lidero com o apoio da Gulbenkian e da Aliança de Civilizações, do Jorge Sampaio). Ligámos ao Dialogue Cafe de Lisboa, do Rio de Janeiro, ao Cairo, ao Dubai e a Doha, no Qatar. No Rio de Janeiro os novos media estão a ser utilizados numa plataforma chamada Viva Rio, para que as pessoas das favelas possam contar o que lá se passa, e que vai muito para além do crime e do que aparece nas capas dos jornais, e que é co-criado pelas pessoas. Em Doah, a Al Jazeera Talk permite que milhares de pessoas, sobretudo do Norte de África e Médio Oriente, consigam fazer uploads de fotografias, vídeos, histórias. Foi o que permitiu que a Al Jazeera continuasse a dar notícias durante a revolução egípcia, mesmo quando Mubarak mandou desligar a Internet. (As revoluções são um processo, não são acontecimentos de geração espontânea. Mesmo na própria Internet foi um processo que demorou anos. O Facebook foi uma das plataformas usadas e foi importante para desencadear, para pôr 25 mil pessoas na Tahrir Square. Mas o que de facto permitiu a revolução foi a adesão maciça da classe média e o apoio da Irmandade Muçulmana.)

 

É por sua causa que o Presidente Cavaco faz comunicações via Facebook?

Já não trabalho na presidência há quatro anos. O Presidente da República já usava Internet antes de ser Presidente, no seu dia-a-dia. Na primeira campanha em que foi eleito percebeu que era uma forma de assegurar alguma desintermediação, interactividade e estimular a participação das pessoas. Foi mais do que uma campanha, foi um movimento.

 

Isso foi instigado por si? Nos últimos quatro anos está em Londres, mas continua essa relação?

Continua, com muito gosto. É uma relação informal, de amizade. Fui convidado pelo Prof. Cavaco Silva e pelo Alexandre Relvas para dirigir a campanha digital, que era algo de novo em Portugal. Concebi-a, tinha uma pequena equipa. Criou-se a figura do mandatário digital para dar relevância política a essa dimensão. Já foi há algum tempo, há seis anos e meio, antes desta vaga da Web 2.0. Mas na altura foi uma campanha pioneira, justamente porque usou muitos princípios que informavam a 2.0 – sobretudo esta ideia da colaboração em rede, de participação e de personalização, de contacto.

 

Num político como Cavaco, houve abertura para este tipo de ferramentas?

O Prof. Cavaco Silva, do contacto que tive e tenho tido com ele, é das pessoas em Portugal que vejo mais abertas a novas ideias. Vejo-o aberto à necessidade de dar espaço a novos protagonistas, a novas empresas. Percebe que algum do bloqueio português tem a ver com o facto de se ter criado um sistema que se perpetua a si próprio, independentemente do partido que está no governo, e que é baseado nalguns interesses, nalgum conforto assegurado no status quo. Daí a importância que tem dado aos temas da inovação, do digital, de Portugal ter uma nova vaga de empresas inovadoras. Só uma nova vaga empreendedora pode levar Portugal a sair desta situação de desemprego galopante. As grandes empresas de amanhã é que vão criar emprego – é essa a minha tese. Todo o esforço devia ser no sentido de se criarem milhares de novas empresas, sabendo que muitas dessas empresas não vão ter sucesso; mas as que tiverem vão criar emprego. Não é o Estado nem as grandes empresas que o vão criar.

 

Com quem aprendeu a trabalhar?

O primeiro emprego que tive foi como colaborador do Público, esporádico, à peça. Escrevia sobre temas de educação. Mas depois, sendo eu próprio um dirigente associativo, não fazia sentido, e deixei de escrever. O meu primeiro emprego foi na Fórum Estudante, trabalhei com o Rui Marques, que conheci no Lusitânia Expresso. Além das pessoas do Público, foi a primeira pessoa com quem aprendi a trabalhar. Era um trabalho intenso, em equipa, muito focado em atingir resultados, numa lógica que não de funcionários.

 

Em equipa é preciso aprender a trabalhar com outros, a gerir egos, competências, poder. E a gerir a tensão.

De preferência que sejam pessoas diferentes. Só aprendemos com pessoas que sejam diferentes. As sociedades, as cidades, as empresas mais vibrantes, são aquelas em que as pessoas não são todas iguais. A inovação acontece pela colisão de diferentes conhecimentos e experiências.

 

Conte uma história que ilustre a vantagem da diversidade.

Uma semana depois de ter chegado à Cisco estava em Beirute para ajudar a construir um plano nacional de banda larga e posicionar aquela cidade como capital criativa no Médio Oriente (e como contraponto do Dubai, capital financeira). Foi o primeiro projecto de que fui responsável. Respira-se uma grande tolerância (no país há 21 religiões). Aquela cidade, que é conhecida pelos maus motivos, é uma das mais criativas que já conheci. Por isso é que toda a publicidade do Médio Oriente é feita lá. Toda a produção televisiva, para todas as cadeias de televisão, é feita nos arredores de Beirute.

Vou dar outro exemplo, de uma cidade onde estive no início desta semana: Belgrado. Tem uma explosão de criatividade incrível. O valor que estava a querer enfatizar é o da diferença. Aprendi no trabalho que faço na Cisco que para se ter acesso a novas perspectivas, a novas ideias, tem que se trabalhar nas fronteiras.

 

Está novamente a falar de correr riscos quando fala de trabalhar nas fronteiras. E do desconhecido.

Aprendo muito internamente. A Cisco é uma empresa global, bem organizada, em que há uma lógica colaborativa enorme. O grupo de que sou director funciona como uma espécie de sensor.

 

Sensor?

Somos responsáveis por estar uns anos à frente da companhia. Somos um sensor que permite identificar quais são as tendências. É uma qualidade fundamental nos dias de hoje. O que aprendi foi que também numa grande empresa, por mais rica que seja, e a Cisco é uma empresa com grande capacidade económica, ninguém inova sozinho. É preciso inovar com outros, com os clientes, incorporar muitas coisas que não fazem parte das suas competências na sua própria cadeia de valor.

 

Uma coisa que o sensor tenha detectado recentemente.

Há pouco tempo andei por toda a Europa, 40 entrevistas, desde Copenhaga até Espanha, com empresas como a Telefonica, a Vodafone, a Intel, com entidades não governamentais, um pouco de tudo. Notei que há uma desconexão entre o que está a ser feito por pequenas e médias empresas ou por grupos de investigação, que fazem pilotos e coisas interessantes, e as organizações que permitem a expansão disso. Muitas vezes a inovação tecnológica, só por si, não é solução. A tecnologia não resolve problemas. As pessoas é que resolvem problemas, e é preciso pôr as pessoas a trabalhar em conjunto. E o nosso pensamento, muito linear, deve ser mitigado por lógicas de aplicação de conhecimentos que vêm de outras disciplinas.

 

É um aspecto a que já aludiu, quando falou da proveniência académica das pessoas com quem trabalha em Inglaterra.

A Antropologia vai ser importante para as empresas como foi o marketing no século XX. Se as pessoas levam a sério esta ideia de co-criar o consumidor, têm que evoluir dos próprios grupos para a research etnográfica. Têm que aprender vivendo com as pessoas, e criando com elas, com um estado de espírito aberto para construir soluções que sejam radicalmente novas.

 

Porque é que não é político? Tendo sido vice-presidente do PSD…

A sua pergunta pressupõe: “Porque é que não é político profissional”? Todos somos políticos, num certo sentido.

 

Porque é que não perseverou na carreira política activa?, porque é que está intermitentemente na vida política?

Porque preservo muito a minha vida privada, e porque respeito imenso quem faz da política a sua actividade profissional. Pode-se contribuir para a sociedade fazendo outras coisas. Tenho contribuído, não só a nível nacional, mas a nível europeu, de forma bastante intensa. Isso também proporciona um arejamento e um contacto com a realidade, e uma reinvenção permanente de nós próprios, que nos permite aportar mais valor sempre que é necessário. Fui presidente de uma associação portuguesa muito dinâmica, a APDC, durante os últimos três anos; aquilo que levou as pessoas a convidarem-me, não morando cá, e o que me levou a aceitar, foi provar que era possível trabalhar em rede, mesmo não estando em Portugal, e fazendo isso numa lógica em que toda a gente participa e nem tudo depende do líder. E para poder partilhar muitas das coisas que tenho vivido ao nível internacional.

 

Não sente atracção pelo lado mais passional da política, ainda que por vezes este seja autofágico?

A politics, política no sentido mais instrumental: não tenho canalizada para aí a minha energia. Tudo o que fiz na política, não procurei. Aconteceu porque me convidaram. Não tenho nenhuma lógica de carreira. Aconteceu porque o Durão Barroso me convidou, e no momento, num congresso, disse que sim. Não tenho andado à procura de nada. Na medida em que posso participar, participo. A minha opção tem sido uma opção de liberdade, de reinvenção permanente, de aprendizagem com o mundo. Se isso um dia puder ser útil a Portugal… Já é, continuo ligado a Portugal, ser emigrante já não é o que era. Depois desta ligação à APDC, fui convidado pela Gulbenkian para colaborar na área da inovação social. Colaboro com várias entidades a nível internacional, na Polónia, Alemanha, Itália, Bruxelas, Inglaterra, com vários comissários europeus. Sempre que sou chamado a colaborar, na medida das minhas possibilidades, colaboro.

 

Tem por hábito ouvir a Billie Holiday de manhã? Era o que estava a tocar quando cheguei.

Gosto muito de jazz. Noventa e nove por cento das minhas músicas são jazz. Quando trabalho em casa estou sempre a ouvir música, a não ser quando tenho que fazer uma conference call. A Billie Holiday é uma das cantoras de que gosto.

 

 

 

Publicado originalmente no Jornal de Negócios em 2011

Diogo Vasconcelos morreu em 2011