Nelly Furtado
Quando ao fim passeávamos pelo parque, eu perguntava-lhe se já tinha escolhido o vestido que levaria aos Junos na noite da sua consagração. Estava ainda hesitante entre uns quantos, e balouçava as argolas gigantes que pendiam para lá do aprumo do cabelo. Semanas mais tarde, as fotografias exibiam-na, radiosa, num vestido primaveril tufado nas mangas, bafejado de flores de cor púrpura. Abraçava quatro dos seis prémios canadianos para os quais estava nomeada, confirmada a excitação à volta do seu álbum de estreia "Whoa, Nelly!".
Nelly ainda refreou os ímpetos no Verão em que andava pelos 18 anos. Do outro lado da linha havia dois rapazes, chamados Gerald Eaton e Brian West, que insistiam no seu talento e a forçavam a voltar a Toronto, onde, aliás, se haviam conhecido há meia dúzia de meses. Os ditos integravam um multiplatinado grupo canadiano de nome The Philosopher Kings, cujo manager passou também a representar Nelly, e produziram a primeira demo de Furtado. O material ficaria adormecido no calor do Verão, na modorra das férias na Europa. Regressada à vida de sempre, em Victoria, com os pais, Nelly recusou o sonho. Que não sabia, que tinha de voltar à escola, blá-blá-blá. Em Toronto, convenciam-na. Que tinha de fazer mais demos, que não podia desistir.
Em duas semanas mudou-lhe a vida. Foi, gravou. O material chegou à DreamWorks, e o resto do processo é conhecido. Para trás ficava a transpiração do sonho, as músicas, avulsas, a ecoarem na sua cabeça. Provavelmente, pensou nelas na noite dos Junos. No kitsch de trazer por casa dos Abba e do Lionel Ritchie, na cassete da Mariah Carey que lhe deram pelos 12 anos, na soul urbana que lhe inspirou a juventude, nos discos dos Radiohead e dos Pulp que surripiou da discoteca do irmão mais velho. Provavelmente, pensou na moderna música portuguesa que descobriu quando cá veio, aos 16. E nas canções ao desafio que bebeu do pai, nos temas religiosos que cantou com a mãe. Nas interpretações em cima dos palcos da comunidade portuguesa que lhe admirava o prodígio e a precocidade. Provavelmente, rememorou todas essas coisas e sentiu-se feliz.
O parque que se estendia à nossa frente era o mais famoso de Londres. O frio cortava. Ela posava, graciosa, indiferente às famílias e ao domingo. Cingia o casaco de pêlo branco ao corpo e acenava aos dois managers americanos, à promotora inglesa, à maquilhadora inglesa (que lhe emprestara o casaco de pêlo branco ...). Tal qual as meninas que trocam de roupa ao mesmo tempo que trocam segredos de rapazes.
Nelly Furtado é uma menina de 22 anos. Tem um pai e uma mãe portugueses. Nasceu no Canadá. É uma prioridade da reputada Dream Works Records; nesse sentido, "I'm like a bird" é peça insistente dê lá o mundo as voltas que der. O álbum que sustenta este single foi escrito por ela, idealizado por ela uma vida inteira. Escreveu canções, aprendeu a tocar instrumentos. Esfolou-se a trabalhar para urdir o seu projecto. Ante o entusiasmo da mãe, com quem debutou nos palcos aos 4 anos, e o silêncio ensimesmado do pai.
Gostava que começasse por falar-me do seu avô açoriano, maestro da banda.
O meu avô Virgínio Araújo Neto era uma lenda em S. Miguel. O seu irmão tocava também nas bandas. Compunham marchas. Havia uma grande paixão pela música na casa da minha mãe.
Onde viviam exactamente?
Ponta Garça, S. Miguel. Eram lavradores.
As letras das canções falavam da lida da terra?
Eram instrumentais. Não faziam vocalizações. Esta minha paixão, por escrever letras de canções, não sei de onde vem. A minha inspiração musical vem do meu avô, do meu tio, da minha mãe.
Que idade tinha a sua mãe quando foi para o Canadá?
25 anos. O meu pai foi primeiro; emigrou com a família para o Canadá também com 25 anos. Conheceu a minha mãe numas férias em S. Miguel, começaram a namorar, e depois mandou-a ir para casarem. A minha mãe tem agora 54 anos. O meu pai vai fazer 60 na quarta-feira.
Vai estar no aniversário do seu pai?
Não.
O que é que vai fazer nesse dia?
Vou estar no «David Letterman Show».
Fica nervosa por estar num show tão importante onde todos os artistas ambicionam estar?
Fico com nervos. Já fiz o «Jay Leno», o «Saturday Nigth Life», que é o mais importante para a música, e esta semana, em Inglaterra, já fiz seis programas de televisão, em directo. Vou-me habituando, perdendo o medo. O «Jay Leno» foi o segundo programa a que fui; aconteceu muito cedo na minha carreira e estava muito nervosa. Tinha medo de não corresponder às expectativas. A voz fica com tremores, e a música sai pior.
Sente-se atemorizada ante a possibilidade de não cantar bem?
Sim. Antes de estar no palco só penso em não ficar nervosa. A música é o mais importante. Quando penso só nisso, fico mais calma. Se penso «Oh, os meus pais estão a ver-me em casa», «Hi, tem tanta gente a assistir», «Ah, o meu vestido», não estou realmente lá no momento.
A sua vida mudou tanto que já não pode assistir ao aniversário do seu pai. Como foi o ano passado?
Estava em Los Angeles a gravar o disco. Estes dois anos têm sido muito cansativos, sem tempo livre. Sobretudo na gravação do disco, trabalhámos muito. 12 horas cada dia, seis dias por semana. Mas estive lá pelos anos da minha mãe.
Em todas as suas entrevistas fala muito mais da sua mãe que do seu pai.
As mães..., há sempre uma relação mais forte. O meu pai é mais calmo, transpira silêncio.
Que tipo de coisas conta à sua mãe que não conta ao seu pai?
Muitas coisas. O meu pai tem o peso dos anos, o seu modo de pensar é antiquado. A relação está agora a ficar mais aberta. Na adolescência, aos 13, 14, 15 a ligação com os pais pára um bocadinho. Com a minha mãe, havia a música: cantava com a minha mãe, participava nas coisas da igreja com a minha mãe. O meu pai gosta de estar sozinho, no jardim, em paz. Há uma parte de mim que é como o meu pai, sossegada e calada. Mas há outra parte que gosta de palco, de ser estrela, gosta de viver.
O seu pai levava a sério a sua carreira, mesmo antes de gravar o disco e de ter sucesso? A sua mãe esteve sempre mais perto do seu potencial artístico.
O meu pai também acreditava. Se tinha um concerto de trombone, os meus pais assistiam juntos. Deram-me a possibilidade e a liberdade de escolher a música; não me forçaram. Às vezes ia para um café tocar o meu violão e dizia «Pai, hoje vou tocar naquele sítio». Ele respondia «Ah, vão pagar-te alguma coisa?»
Pagavam?
Muitas vezes era de graça. Fazia-o para mostrar as minhas canções. Mas os comentários do meu pai não eram negativos; ele gosta de música, também. Gosta de Canções ao Desafio e de Fado. Quando era pequena, levava-nos para as festas para vermos as Canções ao Desafio. Lembro-me bem disso. Nunca o vi cantar, mas sei que cantou. O ano passado pelos anos dei-lhe umas vídeo-cassettes com Canções ao Desafio. Arranjei-as em Toronto numa festa do Dia de Portugal.
Com que periodicidade iam a Portugal? Uma vez por ano?
Nem tanto. Passei Verões inteiros lá, uma vez pelos nove, outra pelos 12 anos. Aos 16 fui sozinha e passei o Verão com a minha avó. O ano passado fui com a minha mãe.
Aquilo era chato para si?
Hum... Quando somos pequenos achamos chatas muitas coisas dos adultos. As Canções ao Desafio não são muito vivas, não têm muita coisa a acontecer no palco: é só sentar e cantar. Mas sempre soube que era uma coisa bonita, com grande história. Com 4/5 anos já dançava nos ranchos folclóricos lá na comunidade. Desde muito nova que apreciava a cultura portuguesa e açoriana. E tinha orgulho.
Tinha mesmo?
Tinha. Porque era uma coisa diferente. Não havia muitos portugueses; em Victoria inteira não há sequer duas mil pessoas luso-descendentes. Na Escola Primária não havia nenhuma portuguesa. Na cidade há muitos ingleses, mesmo ingleses, de pele clara, de cabelo claro. Sentia-me muito diferente. E os outros podiam perceber que eu era diferente... Levava sandes de feijão para a escola
Feijão?
Sim, feijão, de feijoada. Os outros levavam sandes de queijo, fiambre, presunto. O feijão era mesmo português. Sentia essa diferença quase com vergonha. Mas não era vergonha realmente. Tinha a minha comunidade, encontrava-a na igreja. Sentia também orgulho. E chegava a casa da escola, ligava a televisão e não via nunca portugueses. Então pensava «Um dia vou aparecer na televisão para as crianças verem uma pessoa portuguesa». Era um sonho. Por isso estou sempre a falar de Portugal, estou sempre a falar da cultura açoriana.
Qual era o estrato social dos seus colegas da escola? Os pais trabalhavam no duro?
Não. Lembro-me de na primeira classe a professora ter perguntado o emprego dos nossos pais. Um por um fomos dizendo. Quando disse «A minha mãe é mulher de limpeza» olharam-me com surpresa. Eu cresci na sala das máquinas de lavar roupa do motel! Tinha um grande respeito pelos meus pais, e não achava esquisito que a minha mãe fizesse limpezas, que o meu pai trabalhasse com as suas mãos.
O que é que fazem os pais dos seus amigos?
Trabalham em escritórios, são doutores.
Alguma vez se sentiu incomodada pelo facto de os seus pais precisarem de trabalhar no duro para ganhar a vida?
Incomodada?... Envergonhada?
Também.
Um bocadinho. Mas sempre tive respeito. Isso é o que me dá força. Esta vida que tenho agora, (viajar muito, tornar-me uma estrela), é estranha. As pessoas querem que as estrelas tenham um certo comportamento, um certo modo de viver. Eu sou trabalhadora, sou proletariado eternamente. Não há outras pessoas nesta carreira que falem destes assuntos, da sua cultura, da sua retaguarda. O que faz de mim o que sou, é ser portuguesa e ser working class. Isso é Nelly Furtado.
Este passado de menina que trabalhou muito é uma parte do american dream.
A minha vida não era realmente difícil; tínhamos sempre o que precisávamos. Mas sim, o Norte América gosta do conceito de american dream, de um bom sonho, de uma história qualquer. A minha história é gira. Falo nesses assuntos porque a cultura portuguesa faz parte da minha música, o universo português alimenta a minha inspiração. Se não fizesse, não falaria tanto de Portugal.
Sempre teve tudo, mas habituou-se a trabalhar. Ao longo de oito Verões ajudou a sua mãe a fazer as camas do motel.
Sim, sempre trabalhei no Verão.
Com certeza preferia ir para a praia ou piscina.
Trabalhava para ganhar dinheiro para viajar. Os meus pais responsabilizaram-nos muito cedo. A partir dos 12, 13 anos tínhamos de trabalhar para comprar as coisas que queríamos: roupa, viagens. Mas era difícil, sete horas da manhã, sábado, pum pum pum, «Está na hora de ir para o trabalho».
Que idade tinha quando começou a trabalhar?
12 anos. Aos 17 trabalhei o Verão inteiro para pagar o bilhete para Toronto. Fiquei um ano, trabalhei das nove às cinco numa companhia de alarmes. O emprego era muito chato!, mais ruim do que limpar. Usei o dinheiro para pagar as gravações do meu grupo de então (Nellstar) e o bilhete para a Europa.
Como foi esse Verão na Europa?
Fui até Madrid, Barcelona, San Sebastian, Paris, Londres. Viajei cinco semanas. Depois regressei a Victoria, ingressei na Universidade e tirei um curso de escrita criativa. Ao longo desse ano trabalhei também com a minha mãe. E já estava farta!, «Ah, pensava que já tinha acabado, trabalhar no Robin Hood Motel!, oh, quando é que vai acabar?». E sabe uma coisa, intimamente ainda penso que um dia vou limpar quartos no Robin Hood Motel.
A sério?
Trabalhar lá faz parte do meu imaginário. Era mesmo a história da Cinderela, a limpar e a sonhar. Mas não pensava em ser estrela. Pensava em fazer álbuns: nas músicas, nas letras, nos instrumentos.
Quer dizer que tem medo que as coisas voltem para trás?
Nada é eterno. Por isso é importante saborear o momento. Por isso convidei a minha família para ir aos Junos, em Toronto.
Foi nomeada para seis categorias.
Quero que me vejam. Tenho muita fé no meu talento, no que o meu espírito tem para dar. Acredito que vou fazer música, que vou ter sucesso na música. O resto não sei. Há sempre coisas a bater-me na cabeça: uma confusada! Nesta carreira há coisas tão falsas e as pessoas são tão reais... A televisão é falsa. As entrevistas podem ser falsas. Esta não é! [riso]
Obrigada.
Os media têm uma força enorme. Há regras: põe uma cara alegre, não podes ser chata...
É isso que lhe dizem as editoras, os managers?
Os meus managers são muito honestos comigo, não escondem nada que diga respeito à minha carreira. Estou a aprender muito sobre promoção. Não sabia quase nada. É tão diferente quando se está a sonhar...
Qual é a grande diferença?
Imagina-se o aplauso, a paixão da escrita. Não se imagina o trabalho. Sou muito perfeccionista. A guerra é comigo! Nelly quer ser perfeita, na promoção, nas entrevistas, em tudo. Altas expectativas.
As expectativas são suas, para começar.
Sim, sou a pior.
Quando assinou com a DreamWorks confiou-se nas mãos da companhia. Tratam de tudo, não é?
É. Há de repente uma pessoa a marcar as datas da nossa vida! Curiosamente, em miúda, sonhava com isto: acordar e ter alguém a dar-me o plano daquele dia. Sou muito preguiçosa, não sei organizar o tempo. Agora tenho pessoas que me organizam.
Tem um manager pessoal?
Tenho. Está sempre uma pessoa da empresa do meu manager a acompanhar-me. Quando começar a tournée vou ter uma assistente pessoal; mais para ser amiguinha, mas também para ver a roupa, trazer a comida, qualquer coisa.
Portanto, ainda não chegou à fase de se enfadar. Tem saudades da vida normal?
Não. O que me preocupa é conseguir um bom equilíbrio entre as duas coisas de que gosto: a calma e o pragmatismo da vida normal, e a exposição e a azáfama do palco.
Para que lado pende quando dá uma entrevista em português? Seria diferente se falássemos em inglês?
Sim. Sou mais honesta quando falo em português. Porque não tenho muito vocabulário: não tenho palavras para bailar, restrinjo-me aos factos.
Pensa em inglês, o português é a sua segunda língua.
Tenho intenção de passar uns tempos em Lisboa e em S. Miguel para melhorar o meu português. Talvez quando terminar a promoção deste cd. Romanticamente sempre quis viver em Portugal, gosto do estilo de vida da Europa. Com o passar do tempo, gostava de vir.
Não se torna impraticável? O seu sonho não se concretiza neste canto no mundo.
Há uma parte de mim que corresponde à estrela que está no palco. Há outra que permanece nos bastidores.
Uma parte do seu pai, outra da sua mãe.
Isso. A parte do meu pai é a que gosta de pensar, de escrever; é insular. A da minha mãe é a da partilha. Não sei qual prefiro. Talvez a paixão mais forte seja a da escrita, para falar verdade. Talvez gostasse, daqui a uns... dez anos!, de me dedicar aos livros, a uma vida mais calminha. E mais política, também. (Os meus irmãos envolvem-se em assuntos políticos; o meu irmão é socialista). Antes dos 17 anos, não sabia sequer que os meus pais tinham vivido num país fascista! Fiquei interessada em estudar a história de Portugal, em saber quem sou.
Estudar as raízes para melhor perceber aquilo que é.
Sim. E tenho paixão pela ideia de Revolução. A ideia da Revolução é tão gira. Não acha? Aos 16/17 estive em Portugal e descobri um clima muito artístico, a música moderna portuguesa. Foi nessa altura que fiquei ainda mais orgulhosa de ser portuguesa. Descobri que ser português não é só Ranchos Folclóricos e Canções ao Desafio. Há um movimento de modernidade.
Como é que uma rapariga de 22 anos pode ser tão confiante?
A música dá-me essa confiança. Toquei instrumentos. Cantei. Dancei. Ouvi sempre palavras elogiosas dos professores, dos colegas, da família, «És muito talentosa, tens de fazer isso pela tua carreira».
Na Comunidade era olhada como a menina prodígio, a menina precoce?
Era a menina perfeita. (risos) Desde pequena. Era boa aluna, era exemplar. Mas na adolescência, pelos 13/14 anos, fiquei muito interessada em divertir-me com as minhas amigas!
Os seus pais deixavam-na sair? As famílias portuguesas, por tradição, restringem as saídas das raparigas.
Para a minha irmã foi mais difícil, é mais velha. Eu fugia pela janela. Nunca fui apanhada! O meu pai é muito antiquado no que toca a rapazes. Não me deixava levar namorados lá a casa; à minha irmã deixava. Era também essa coisa de ser perfeita, de ser princesa, «Ninguém toca na Nelly». A minha mãe chamava-me sempre nomes abebezados... Eu respondia «Não sou bebé!».
Tem namorado?
Já tive. Era um emigrante português da Lourinhã. Terminámos em Setembro.
Não tem tempo para namorar?
Não. E, para falar a verdade, tenho medo do amor. Viajo muito e se me apaixonasse levaria uma vida de saudade. Estou melhor assim, livre, solteira. Mas claro que quero uma família. Se Deus quiser.
Que tipo de relação tem agora com a sua família?
Temos uma relação mais adulta. Eles respeitam-me, vêem que trabalho muito. As pessoas são o que são; resulta da educação que tiveram, resulta daquilo que naturalmente são. Penso que já nasci assim, com sentido de responsabilidade. Às vezes sinto que o meu destino já está marcado. E o meu destino é fazer os outros felizes com a minha música. É só.
O que sentem as pessoas da sua família em relação ao seu percurso?
[engasga-se com o mel que fica na garganta]
Estão muito orgulhosos. Ao mesmo tempo... A minha família é muito humilde. O meu titi era lavrador, quando tinha inspiração parava e compunha música; talvez o seu sonho fosse a música...
E agora corporiza o sonho de toda a família.
Acho que é isso. Mas a minha avó não aprecia que ande em tournée, que viaje tanto, que conheça tantos rapazes. Quando viu o video-clip, estavam todos na televisão da cozinha a assistir... Sabe aquela parte em que aparecem milhares de pessoas? Ela viu essa parte e comentou «Com a barriga de fora diante destes rapazes todos!» (gargalhada) Para dizer que a minha avó está orgulhosa, mas não percebe a minha vida.
Os seus pais percebem?
É difícil. São também humildes, olham para esta vida de forma muito glamorosa.
Têm medo que fique outra, transformada por esta vida glamorosa?
Talvez sim. Talvez tenham medo que fique muito distante daquilo que são.
Você tem medo, medo de ficar demasiado distante da vida que teve?
Tenho sim, tenho medo de ficar estrangeira. Não quero ficar distante. Não tenho mais nada, entende? Só tenho a minha família. As pessoas não têm nada se não têm família. Aquilo é o amor verdadeiro. Cortar? Acho que não podia...
Publicado originalmente na Revista Selecções do Reader’s Digest em 2001